A emergência de novas formas de crítica sobre e no design

A partir de 1990, emergiu um modelo crítico no design que veio redefinir o seu papel e se vinculou não só à investigação, mas também à própria prática do design. Apesar disso, ainda que não de uma forma muito sistematizada, ao longo da história do design contemporâneo, a crítica no design teve um carácter omnipresente quer ao nível da pesquisa, ao incorporar métodos especulativos e críticos, quer ao nível da prática ao dar resposta aos briefings dos clientes. Contudo, apesar de numa maneira geral estar presente na actividade do designer, assumidamente ou não, o design criticism continua a ser uma área de estudo ainda sub-explorada, nomeadamente quando colocada em perspectiva relativamente a outras disciplinas académicas como arquitectura e a arte, nas quais há uma tradição muito mais fortemente desenvolvida. Mas, com a mudança de paradigma e emergência de novos media para a crítica, assim como de novos críticos, será que se está a criar um ambiente propício para que a critical practice e o design criticism sejam mais exploradas? [1] [2]

 

Novo medium, novos críticos

O movimento do critical design rompeu com os limites de uma actividade crítica desenvolvida apenas de uma forma externa à prática, dando lugar a abordagens especulativas que relacionam teoria com prática projectual. [1] Ao mesmo tempo que esta aproximação se deu, o papel dos críticos profissionais em design gráfico passa a ser questionado. Críticos como Rick Poynor, escritor britânico de design, cujos contributos para um pensamento em design são inegáveis, não parecem ser comuns. Mas, apesar de haver valor neste tipo de crítica exterior ao design, não se deve perder de vista as formas específicas através das quais discurso crítico surge em meios alternativos, dado que o criticism deixa de ser exclusivo a revistas profissionais, deslocando-se também para publicações independentes, exposições pop-up e workshops. [3] Um exemplo desta mudança de paradigma é o Post-Eady Forum, iniciativa de alunos do Royal College of Art, que passa por criar espaços alternativos onde a crítica se transforma num lugar de participação, e onde as redes sociais se constituem como medium para a criação e divulgação de formas críticas que questionam o status quo e o próprio design enquanto disciplina. Nestas novas manifestações de crítica que englobam desde projectos curatoriais a discussões online, abre-se, assim, um espaço virtual habitado por um colectivo e caracterizado por uma idealização e também pela criatividade. De facto, a expansão da crítica a novas plataformas cria uma pluralidade de suportes que alargam as possibilidades de exploração de uma crítica sobre design, e também no design, algo anteriormente restrito a publicações profissionais, e agora com potencial participativo e exploratório ampliado neste medium. [4]

Imagem 1: Cartaz desenvolvido para apresentar o workshop Tumblr Manifesto or the Critical Intentions of the Squiggly Line, na Royal College of Art. / Imagem 2: Tweet apresentado pelo colectivo Post-Eady, constituído por alunos que se graduaram do Royal College of Art.

 

Contudo, esta alteração nos media e processos de participação na crítica veio também provocar mudanças nas próprias formas de fazer crítica. Os novos formatos libertam-se da formalidade no discurso, característica da crítica presente nas revistas profissionais, e vão para além dos sistemas e convenções da escrita académica. Surgem, assim, formas de linguagem alternativas para o desenvolvimento da crítica: para além do ambiente estanque das páginas de uma revista, surge a possibilidade de uma participação alargada na construção do design criticism, que deixa de se restringir aos teóricos e académicos. Actualmente, qualquer designer poder partilhar o seu discurso crítico nas mais variadas plataformas online de carácter informal. Para além disso, como Teal Triggs afirma, a secção de comentários online cria também um novo espaço que vai prolongar a discussão e a crítica, possibilitando uma reacção por parte dos leitores-participantes que permite uma participação mais alargada.

 

Novas formas de crítica

Este novo paradigma da crítica sobre e no design, suporta uma variedade de contribuições, com carácteres marcadamente diferentes, incluindo desde trabalhos académicos, sustentados por um corpo teórico e/ou prático vastos, até comentários ou textos mais casuais. Desta forma, parece representar uma alternativa mais aberta e interactiva, na qual uma linguagem crítica no design se pode desenvolver de uma forma muito própria e particular. Sugere um afastamento de uma narrativa única e homogénea, abrindo as portas para a exploração de diferentes realidades, de uma forma mais inclusiva que permite encontrar pontos de intersecção entre pontos de vista diferentes, levantando novas questões e gerando novas possibilidades. [4] [5]

Apesar disso, penso ser também relevante pensar no risco desta facilidade de participação se transformar num facilitismo. Como plataforma alternativa para uma crítica bem fundamentada e/ou uma exploração da prática contextual sustentada, parece ser uma mais-valia, mas não será efémero e superficial o contributo destas plataformas, se a crítica se reduzir a uma retórica pouco rigorosa? A verdade é que os textos académicos não são as únicas formas de crítica válidas, e restringir o design criticism a este tipo de formato parece criar limites desnecessários para o que a crítica no design pode alcançar. Mesmo com a possibilidade de críticas menos bem sustentadas, parece-me que estas novas plataformas contribuem para sustentar uma cultura de critical writing e critical practice mais ricas e a própria flexibilidade dos meios cria a possibilidade de contribuições de carácter diferentes, mas que não deixam de ter potencial transformativo na exploração de novas formas de ver o mundo. Este novo paradigma parece ir para além de formas de crítica no design algo estagnadas, explorando práticas diferentes, assim como um discurso crítico mais equilibrado e diverso com responsabilidade social e política mais ampla e potencialmente inclusiva.

Sofia Machado

 


 

Palavras-chave:

design, design criticism, critical practice, participatory design

 

Referências:

[1] MAZÉ, Ramia. 2009. Critical of what? In Iaspis Forum on Design and Critical Practice – The Reader. Sternberg Press, Berlin, pp. 378-397.

[2] POYNOR, Rick; ROCK, Michael. What is this thing called graphic design criticism?. Disponível em: <http://www.eyemagazine.com/feature/article/what-is-this-thing-called-graphic-design-criticism>

[3] Eye Magazine (2013). Critical mass. Disponível em: <http://www.eyemagazine.com/blog/post/critical-mass>

[4] WINTERS, Tara (2012).  The Practitioner-Researcher Contribution to a Developing Criticism for Graphic Design. Disponível em: <http://www.tandfonline.com/doi/pdf/10.1080/19235003.2012.11428506?needAccess=true>

[5] HELLER, Steven (2014). Criticizing Criticism: Too Little and Too Much. Disponível em: <https://eyeondesign.aiga.org/criticizing-criticism-too-little-and-too-much/>

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